Homem acusado de dopar a mulher para ser estuprada por estranhos é julgado na França; veja depoimentos da 1ª semana

Homem acusado de dopar a mulher para ser estuprada por estranhos é julgado na França; veja depoimentos da 1ª semana

Nesta quinta-feira (5), Gisèle Pélicot, de 72 anos, vítima dos abusos, falou pela primeira vez sobre o caso. No dia seguinte, foi a vez da filha de Dominique e a atual e ex-nora dele falarem ao tribunal. Gisèle Pélicot, vítima dos estupros (ao centro), ao lado da filha Caroline, de preto, e dos dois filhos – a nora Céline é a de branco
Christophe SIMON / AFP
Na segunda-feira (2) começou em Avignon, no sul da França, o julgamento de Dominique Pélicot. Ele é acusado de dopar a mulher por 10 anos para que desconhecidos a estuprassem. Mais 50 homens são acusados de terem participado dos abusos.
A vítima Gisèle, de 72 anos, está acompanhando todo o caso de perto no tribunal desde o primeiro dia, ao lado dos advogados e dos três filhos.
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Segundo a agência de notícias AFP, o julgamento deve seguir até 20 de dezembro. Durante os últimos cinco dias de audiência, nesta semana, muitos depoimentos fortes vêm chocando o público em todo mundo.
A escolha de abrir mão do anonimato e não fazer um julgamento a portas fechadas, inclusive, foi uma escolha de Gisèle. Segundo o advogado da vítima, ela quis mostrar o que sofreu ao público para que “isso nunca mais aconteça” e porque o silêncio era tudo “o que seus agressores queriam”.
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Veja as principais declarações dessa primeira semana:
Gisèle Pélicot
Gisèle Pélicot
Christophe SIMON / AFP
“Que eles reconheçam os fatos, o contrário é insuportável. Que eles tenham, pelo menos uma vez na vida, a responsabilidade de reconhecer seus atos. Estes senhores permitiram-se entrar na minha casa, não me violaram com uma arma apontada à cabeça. Estupraram-me com toda a consciência. Por que não foram à delegacia? Até um telefonema anônimo poderia salvar minha vida.”
“Assisti a todos os vídeos. Não são cenas de sexo, são cenas de estupro; dois, três deles sobre mim. Fui sacrificada no altar do vício. Quando vemos essa mulher, drogada, maltratada, morta na cama… Claro que o corpo não está frio, está quente, mas eu estou como se estivesse morta. Esses homens estão me contaminando, aproveitando-se de mim.”
“Dentro de mim sou um campo de ruínas. A fachada é sólida, mas por trás dela…”
“Em 50 anos não tivemos uma vida linear, mas sempre nos mantivemos unidos. Problemas financeiros, problemas de relacionamento, problemas de saúde… Sempre apoiei meu marido. Tenho um sentimento de nojo, tínhamos tudo para sermos felizes, tudo. Não entendo como ele conseguiu chegar a isso.”
Caroline Pélicot, filha do casal
Caroline sendo amparada pelo irmão, ao lado da mãe
Christophe SIMON / AFP
“Meu pai é sem dúvida um dos maiores criminosos sexuais dos últimos 20 anos.”
“Amava meu pai, amava a imagem do homem que eu achava que conhecia. Um homem saudável, amável, respeitado. Descobri que o homem que era meu pai, em que eu tinha total confiança, que achava que era íntegro, que respeitava sua filha, que estava orgulhoso dela e que sempre a havia animado, na verdade havia me fotografado nua sem eu saber.”
“Minha mãe me disse: ‘Passei quase o dia inteiro na delegacia. Seu pai me drogou para me estuprar com estranhos’. Liguei para meus irmãos. Nos sentimos indefesos, choramos. Não entendemos o que estava acontecendo. Sofremos uma dor que não desejo a ninguém.”
“Estou convencida de que fui drogada, mas ele nunca vai admitir.”
Céline, nora de Dominique e Gisèle
“Todos os netos da família perderam sua inocência.”
Sobre fotos suas nua: “Onde estão essas fotos? Para quem ele as enviou? A quem pertencem e onde estão agora, ou estarão dentro de 5, 10 anos?”
“Os nossos filhos poderiam ter testemunhado coisas, poderiam ter ouvido coisas, poderiam ter estado presentes.”
Aurore, ex-nora de Dominique e Gisèle
“Senti tanta raiva ao ver a falta de respeito com que um ser humano pode ser tratado.”
Sobre já ter sido vítima de abuso na infância: “Como vítimas de abuso, tendemos a duvidar da veracidade do que ouvimos. Dizemos a nós mesmos: ‘Não vejo o mal em todos os lugares?’. Não ficarei mais calada”.
Médica perita que examinou Gisèle
“Ela escapou milagrosamente da contaminação pelo HIV e pelas hepatites B e C, mas contraiu quatro doenças sexualmente transmissíveis, necessitando de tratamento com antibióticos, incluindo um por via intramuscular.”
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Antoine Camus, advogado de Gisèle Pélicot
“Ela vivenciará pela primeira vez, de forma diferida, os estupros que sofreu durante dez anos, já que não tem nenhuma lembrança.”
Beatrice Zavarro, advogada de defesa de Dominique Pélicot
“Este é um homem que teve uma vida difícil, que, apesar de tudo, continuou a viver, constituiu família e, em dado momento, algo mudou quando ele se aposentou. Suponho que com dias menos ocupados e com a infância o alcançando.”
Saiba mais sobre o caso:
Quantas vezes a vítima foi estuprada?
Como a vítima descobriu que era violentada?
Como os crimes aconteciam?
Por que a vítima resolveu tornar o caso público?
O que aconteceu com a filha do casal?
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Quantas vezes a vítima foi estuprada?
Réus sendo orientados por advogada durante audiência
Christophe SIMON / AFP
Segundo as investigações, ao longo dos últimos anos, Gisèle foi estuprada 92 vezes. Os crimes foram cometidos por 72 homens diferentes, com idades entre 21 e 68 anos.
A acusação formal envolve apenas 50 réus, além do ex-marido da vítima. Os outros 22 abusadores não foram formalmente identificados.
Do total de réus, 18 estão em prisão preventiva, incluindo o ex-marido de Gisèle.
Na terça-feira (3), ao serem questionados pelo juiz, 35 réus se declararam inocentes. Além disso, 13 disseram ser culpados. Um deles está foragido, e outro não compareceu ao tribunal.
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Como a vítima descobriu que era violentada?
Gisèle descobriu que era violentada por acaso, em 2020. À época, o marido foi flagrado filmando sob as saias de três mulheres em um supermercado.
Ela foi intimada para prestar depoimento na delegacia, e um policial mostrou imagens encontradas no computador de Dominique.
Os investigadores descobriram milhares de fotos e vídeos de Gisèle visivelmente inconsciente, estuprada por estranhos, dentro da casa da família.
Além disso, a polícia encontrou conversas de Dominique convidando homens para ter relações sexuais com a esposa dele.
“Tenho um sentimento de nojo, tínhamos tudo para sermos felizes, tudo. Não entendo como ele conseguiu chegar a isso”, lamenta Gisèle.
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Como os crimes aconteciam?
O ex-marido da vítima admitiu que dava para esposa tranquilizantes potentes sem que ela soubesse. Depois disso, ele convidava outros homens para estuprá-la, usando um site de encontros da França.
Segundo as investigações, o réu orientava os homens para que não acordassem a vítima. Ele também pedia para que os abusadores não usassem perfume ou tabaco.
Além disso, os estupradores tiravam a roupa na cozinha, para evitar que elas fossem esquecidas no quarto.
De acordo com o processo judicial, o ex-marido de Gisèle participava dos estupros e filmava os crimes. Ele não pedia dinheiro em troca.
Alguns acusados afirmaram que não sabiam que a vítima estava drogada e alegaram que pensavam estar participando de uma fantasia sexual do casal.
Por outro lado, Dominique disse que todos sabiam que a mulher estava inconsciente.
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Por que a vítima resolveu tornar o caso público?
Protesto na porta do tribunal
Christophe SIMON / AFP
Gisèle Pélicot falou pela primeira vez sobre o caso na quinta-feira (5). Segundo um dos advogados da vítima, ela renunciou o direito ao anonimato para que “isso nunca mais aconteça”.
“Assisti a todos os vídeos. Não são cenas de sexo, são cenas de estupro. Dois, três deles sobre mim. Fui sacrificada no altar do vício”, disse à imprensa.
Ela também não poupou os abusadores e criticou o fato de nenhum deles ter denunciado o que ela estava sofrendo.
“Estes senhores se permitiram entrar na minha casa, não me violaram com uma arma apontada à cabeça. Me estupraram com toda a consciência. Por que não foram à delegacia? Até um telefonema anônimo poderia salvar minha vida”, disse.
Segundo a imprensa francesa, durante todo depoimento no julgamento, a francesa se mostrou firme. No entanto, ao juiz, ela admitiu:
“Dentro de mim sou um campo de ruínas. A fachada é sólida, mas por trás dela…”
A defesa da vítima acredita que um julgamento a portas fechadas era tudo o que os investigados queriam.
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O que aconteceu com a filha do casal?
Gisèle e Dominique tiveram três filhos. Uma das filhas, Caroline, descobriu durante o julgamento que o pai guardava fotos dela nua.
As fotos foram encontradas no computador de Dominique, em uma pasta intitulada “Em volta da minha filha, nua”.
Segundo a imprensa francesa, a mulher deixou a sala de audiência tremendo e chorando. Ela só retornou ao local 20 minutos depois.
Ao jornal “Le Parisien”, Caroline confessou temer a possibilidade de também ter sido estuprada sem saber.
“Estou convencida de que fui drogada, mas ele nunca vai admitir.”
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